TEMPO DE ESPERA
A Foco Minas é a mostra onde em toda edição estreamos um filme de longa-metragem mineiro e que na maior parte dos casos desafia qualquer identidade do que venha a ser considerado produção contemporânea de Minas Gerais. A Estação, de Cristina Maure é uma prova disso
O longa de estreia de Cristina Maure tem um ponto de partida intrigante, pois beckettiano: Sofia, uma mulher aparentemente estrangeira e à procura do marido, chega a uma vila de nome Clemência quando o trem onde viaja quebra. Ali tem o feitor da estação lhe diz que não há previsão para a passagem do próximo trem que pode passar em cinco dias, a qualquer dia ou talvez dali a cinco anos. Ele hospeda Sofia na pousada que a Companhia Ferroviária Nacional oferece de cortesia aos viajantes que aguardam o trem.
A história tem algo de literário e nos remete à produção literária e teatral européia do período da Segunda Guerra – algo entre o teatro do absurdo e o surrealismo – e soa, como a protagonista Sofia, estranha no seu tempo. É um filme com camadas anacrônicas: tudo nos evoca uma época passada, nas falas, nos trajes, na trama de viagem de trem e na dramaturgia de época. Cada sujeito, desejo e paisagem é uma projeção fantasmática.Temos o preto e branco, o acento teatral na espacialidade e na marcação dos atores e atrizes nos interiores, as paisagens como um afresco em que o p&b e o vazio assumem uma atmosfera quase digressiva e os personagens parecem estarem sempre entre a vigília e o sonho.
O que faz, então, de A Estação um autêntico filme de seu tempo? Certamente não é a atualidade do tema, as urgências do mundo que deveriam, supostamente, ser representadas ou tendências estilísticas em voga no cinema contemporâneo, mas sim seus sentimentos desencontrados, sua concepção de temporalidade na qual parecem existir/caber todos os tempos e, sobretudo, seu desinteresse em querer se apresentar como uma peça sintomática das questões de sua época. O filme de Maure busca outras coisas. Cabe o/a espectador/a adentrar à viagem desse tempo de espera de Sofia. Por fim, algo evidentemente signo do nota: os atores e atrizes (Jimena Castiglione, Rodolfo Vaz, Docy Moreira, Rafael Martini, Elliseu Custódio, Bruna Chiaradia, Pedro Lanna, Eid Ribeiro, Katu Silva Sanglard, Magdale Alves) fazem um espetáculo tão forte quanto discreto.
Francis Vogner dos Reis
Juliano Gomes
Tatiana Carvalho Costa
Curadores
Rubens Fabricio Anzolin
Curador assistente
