ESPECULATIVO, CARTÓRIO DAS ALMAS É FICÇÃO CIENTÍFICA DE IMAGINAÇÃO VISUAL

A Mostra Olhares, que já esteve presente em outras edições, busca apresentar uma diversidade estilística e a singularidade de olhares nos filmes da última safra do cinema brasileiro. Vencedor do Prêmio do Júri Popular no Festival de Brasília, o brasiliense Cartório das Almas, de Leo Bello, ainda levou os prêmios de Melhor Edição de Som (Olivia Hernandez) e de Melhor Direção de Arte (Maíra Carvalho). O filme é uma ficção científica que faz especulações filosóficas sobre a morte. Para tanto, o cenário do Cerrado somado à frieza imaginativa de um cenário futurista ajuda a compor uma atmosfera na qual se instala uma desolação cósmica dos personagens, em especial na protagonista Laura (Gabriela Correa), uma mulher de aparência jovem que conta 126 anos e que trabalha no Cartório das Almas, onde registra os motivos dos indivíduos optarem pela morte.

Esse controle sobre a existência gera enfado. O controle suspende o imponderável. A distopia é menos a destruição (como geralmente pensamos quando se trata de uma ficção científica) e mais perda do sentido profundo da vida, a administração burocrática da vida. Para quem gosta do gênero, certamente vai se interessar pelo estilo do filme e das atuações. O filme toma parte nessa tradição futurista de traço filosófico, que conhecemos de Aldous Huxley, Fritz Lang, Tarkovski e Kubrick. Cartório das Almas tem um elã existencial raro não só no gênero realizado no Brasil, como no próprio cinema brasileiro contemporâneo. O filme de Leo Bello é algo mais introspectivo, vagaroso, contemplativo e pode agradar inclusive quem não é fã do gênero por sua aposta reflexiva.

Francis Vogner dos Reis
Curador