FORMAS DE UM CINEMA EM INVENÇÃO NOS FILMES DE ESCOLAS

A Mostra Formação tem como objetivo dar visibilidade a produções feitas em ambientes de estudo, seja universidades, escolas livres de cinema ou processos de formação pontuais. As dez produções presentes na Mostra deste ano englobam desde exercícios formais resgatando imagens de cineastas estrangeiros cultuados no Brasil até documentários de cunho sociológico sobre tradições culturais brasileiras.

A primeira sessão abre com Ninguém Canta Igual Eu Canto, direção coletiva dos moradores da Comunidade Quilombola de Monte Alegre, no Espírito Santo, filme-diário sobre o quilombo, uma construção de memória imageticamente documentada em torno desse agrupamento social. A sessão continua com Enquadro (depto.?), da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), dirigido por Gabriel Dôco, Lucas Shin-iti, Luísa Martins e Yari Delgado. Mantendo a tradição no estado de produção forte em cinema de animação, o filme bebe na fonte de Alice no País das Maravilhas para pensar um mundo imaginário a partir da obra de uma jovem artista. Alumbrado, produzido durante a segunda edição do Lab RN – Laboratório para Jovens Roteiristas do Rio Grande do Norte, organizado pelo festival Curta Caicó, e dirigido por Catarina Calungueira, é um documentário em tom poético sobre o bonequeiro Marcelino, que vive no interior do estado do Rio Grande do Norte. Partindo de uma tradição de ex-votos mantida pelo pai, ele aprendeu desde criança a fazer personagens de madeira e transformou a paixão em ofício que encanta crianças por onde passa. Expurgo, do Centro Universitário UNA (MG), dirigido por Henrique Canazart, é um ensaio poético sobre memória e pertencimento, em que uma mulher ritualiza suas lembranças em forma de gestos e ritmos. Em fotografia que contrasta o corpo negro e feminino e as paisagens do interior do Brasil, o filme convida a sentir o lado sensório de uma performance corporal compartilhada. A sessão se encerra com Eu Faço Loucuras por Você, da Academia Internacional de Cinema de São Paulo (AIC), uma comédia doce-amarga sobre uma mulher que trabalha como telemensageira do amor (desses carros enfeitados que percorrem a cidade para levar palavras de emoção e reconhecimento). Sozinha em suas andanças, ela talvez encontre o amor num outro coração perdido em uma esquina.

A segunda sessão começa com Muito Permanece, também da AIC, dirigido por Jéssica Alves Vassaitis, ficção intimista sobre uma mulher solitária vivendo numa casa velha. Para além do hiper-realismo da situação, dos planos longos e da estética do comum, ressalta-se o trabalho de fotografia e montagem, nas cenas em que ela lembra do seu passado amoroso e na subida calvárica das escadarias da sua comunidade. A animação Carcinização, de Denis Souza, da Universidade Federal de Pelotas (Ufpel), é uma animação de tom moderninho sobre um garoto que deseja se tornar um caranguejo. Já A Live, de Felipe Paixão e Angelo Antonio, da Universidade Federal de Sergipe (UFS), é uma divertida sátira ao mundo das redes sociais. Um influencer se vê metido numa escalada de suspense e terror e o filme usa do gênero para dar conta da obsessão da nossa época por fama e reconhecimento. Meio Éden, de Clara Estolano, da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF), propõe uma releitura de Jeann Dielmann (1975), da diretora belga Chantal Akerman e eleito o melhor filme de sua década. Numa exacerbação das situações violentas representadas no filme-fonte, o curta aposta numa aproximação formal com a obra de Akerman, sem deixar de lado discussões sobre ser mulher no interior do Brasil em 2023. A sessão termina com Kila e Mauna, de Ella Monstra, da Vila das Artes (Ceará), espécie de Thelma e Louise do fim do mundo. Duas amigas travestis partem numa viagem por um mundo distópico e a ficção científica ganha ares de reinvenção de formas e de gêneros abertos para o futuro. Boas sessões!

Camila Vieira
Leonardo Amaral
Lorenna Rocha
Mariana Queen Nwabasili
Pedro Guimarães

Curadores